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terça-feira, 26 de junho de 2012

E depois da Rio+20?

Cardeal Odilo Pedro Scherer,
Arcebispo de São Paulo e Presidente do Regional Sul 1 da CNBB

A Conferência das Nações Unidas sobre o desenvolvimento sustentável foi concluída em meio a críticas, frustrações, elogios e sensação do dever cumprido...  Parece contraditório, mas houve de tudo isso um pouco, ou bastante.

Críticas sobre a pouca ousadia do Documento final do consenso atingido após longas negociações; houve quem achou que foi uma ocasião perdida para estabelecer metas mais estritas sobre a redução das emissões de gases de efeito estufa; os grandes poluidores do ambiente vão continuar poluindo, sem que nada aconteça? Os combustíveis fósseis altamente poluidores, como carvão e petróleo, serão ainda utilizados, sem restrições? A energia atômica vai continuar a receber altos financiamentos, em vez das fontes alternativas de energia limpa?

Os defensores mais radicais de uma “economia verde” sentiram-se frustrados; entre outros motivos, porque os países ricos, que também são as maiores responsáveis pelos problemas ambientais decorrentes de um modelo predatório de economia, não assumiram compromissos concretos para financiar a superação desse modelo de produção e consumo; a sonhada “caixa comum” para fomentar o desenvolvimento sustentável não foi criada... E os países pobres, ou em desenvolvimento, reclamaram porque, feitas as contas, perceberam que a fatura desse processo vai sobrar para eles... Pior que isso: as regras desse jogo ainda serão dadas pelas mesmas grandes economias, que já têm o mando da partida assegurado... Países pequenos reclamaram por se verem abandonados à própria sorte, ou reduzidos à condição de fornecedores de matérias primas...

Elogios sobraram ao Brasil, pela hospitalidade carioca e a organização do evento, pela liderança no período final das negociações, garantindo, ao menos, a feitura de um Documento de consenso... Elogios aos países que já estão desenvolvendo tecnologias para o uso de fontes limpas e sustentáveis de energia, como a eólica, a hidroelétrica e o etanol; mais uma vez, valeu para o Brasil, líder nesse setor.
Sensação do dever cumprido, ainda por conta do Brasil, por ter chegado ao final do grande evento, de esquemas complexos de organização, logística e segurança, sem ninguém se machucar... A mesma sensação do dever cumprido também sentiram as numerosas Organizações da sociedade civil, que fizeram na Cúpula dos Povos o contraponto ao evento oficial da Conferência Rio+20. Cada um disse a sua, contribuiu como quis e quanto quis, mesmo se as contribuições nem sempre afinavam, ou fossem levadas em conta na Declaração oficial... Era, sem dúvida, importante, que essas contribuições aparecessem, pois ajudaram a despertar mais a consciência geral sobre o quê vai acontecendo com a economia, o clima, a natureza, a sociedade...

Se ficou na boca um gostinho de amargo, porque o resultado não foi o ideal, talvez também foi porque se esperou demais de uma Conferência, que não tinha poderes decisórios; e acontecia numa conjuntura econômico-financeira mundial muito ruim onde, falar de desenvolvimento sustentável, podia levar a pensar logo em mais problemas para a economia... Mas é inegável que a Rio+20 contribuiu para uma nova tomada de consciência sobre os problemas decorrentes da relação, nem sempre responsável, do homem com a natureza. E isso não é nada desprezível.

Publicado em O SÃO PAULO, ed. de 26.06.2012

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