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quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

2012 e o Concílio

Por D. Demétrio Valentini, bispo de Jales

          O ano de 2012 está chegando ao fim. Seria o momento oportuno para recordar os seus principais acontecimentos. Mas não é esta a intenção.

           Ao longo de 2012 foi lembrada, com insistência, uma data, através da qual dá para captar o recado especial que este ano queria nos dar.

           Esta data foi o dia 11 de outubro. Em princípio, ela merecia o devido destaque, por lembrar os 50 anos da abertura do Concílio Ecumênico Vaticano Segundo.

           Mas o que chamou a atenção foi a forte insistência da Igreja, em apontar para aquele dia, fazendo dele não só uma recordação histórica, mas o ponto de referência para balizar o seu posicionamento diante dos novos desafios que ela tem para a frente.  

          De tal modo que, ao redor do dia 11 de outubro, foi criada uma forte expectativa. A esta data ficaram vinculadas algumas iniciativas que mostravam o amplo envolvimento da Igreja com o referido Concílio Ecumênico.

          Foi realizado, por exemplo, ao longo do mês de outubro, o Sínodo sobre a Nova Evangelização e sobre a Transmissão da Fé.  Mas sobretudo, foi inaugurado no dia 11 de outubro  o Ano da Fé, com uma proposta de celebração muito envolvente ao longo de 2013.

          A insistência em vincular a agenda de agora com uma data do passado, parece mostrar com evidência a grande validade deste Concílio, mesmo que já tenham passado 50 anos de sua abertura em 1962.

          Mas afirmar sua validade não significa apostar na implementação dos seus objetivos.  Depende de como nos posicionamos agora, sobretudo, diante das propostas de renovação eclesial, formuladas pelo Concílio, mas deixadas em aberto, para serem implementadas depois, gradualmente, num amplo processo que agora  pode estar perdendo força.

          De tal modo que a celebração dos 50 anos de sua abertura revelou a grandeza do Vaticano Segundo, que se mostrou muito generoso nas suas intenções. Mas mostrou também que ele foi muito tímido na efetivação de mudanças estratégicas, que fortaleceriam a efetividade do processo de renovação eclesial.
          De tal modo que dá para concluir este ano de 2012, com uma tarefa bem cumprida: foi construído um amplo consenso sobre a importância do Vaticano II.

           Ao mesmo tempo, este ano nos deixa com uma clara inquietação:  o processo eclesial em andamento,  ele favorece a aplicação do Concílio, ou conspira contra as suas intenções fundamentais?
            Seria conveniente lembrar as grandes intuições pastorais do Concílio, para conferir qual a dinâmica que agora as caracteriza. Por exemplo, qual a aplicação prática da Colegialidade Episcopal para garantir uma tranqüila postura de unidade,e ao mesmo tempo o suporte seguro para uma salutar descentralização eclesial.

          E assim daria para lembrar a importância das “Igrejas Locais” como referência eclesial indispensável para todos os que querem participar da vida da Igreja. Igualmente a importância imprescindível das comunidades eclesiais, como encarnação concreta da vida de Igreja.

        Em outras palavras, estamos avançando, ou retrocedendo, na aplicação do Vaticano II? Algumas iniciativas dão a clara impressão de marcha a ré.

        Para uma viagem tranqüila, é importante que todas as marchas possam ser bem engrenadas. Também a marcha à ré, cuja utilização às vezes se torna imprescindível para garantir que o veículo siga em frente. O problemático seria engatar esta marcha para voltar atrás e desistir do rumo traçado.
          

Donde vem a paz?

Por Dom  Pedro Carlos Cipolini, Bispo de Amparo (SP)

Glória a Deus nas alturas e paz na terra às pessoas de boa vontade! Foi este o anúncio de Natal que ouvimos do Evangelho de Lucas (cap.1,14). Este anúncio natalino preanuncia outro anúncio, feito por Jesus quando declara que são bem aventurados os que constroem a paz, porque serão chamados filhos de Deus (Mt 5,9). No primeiro dia do ano é celebrado o dia da paz ou da “confraternização universal”.

Dedicar um dia para comemorar a paz e a confraternização, é dedicar um dia para comemorar o sonho de Deus. Sonho que coincide com o sonho e os anseios mais íntimos do coração humano. Todos desejamos a paz e por ela suspiramos ardentemente. Até mesmo os que fazem a guerra. Estes imaginam que a melhor maneira de conseguir a paz é se prevenir através da guerra: guerra preventiva como a chama a administração Busch.

A paz que os anjos anunciaram, a paz no conceito cristão não designa simples ausência de conflito ou o fim de um estado de guerra. Para o cristianismo a paz faz memória da criação, da harmonia primeira descrita na Bíblia. No Paraíso havia a glória da convivência pacífica entre a Criação, as Criaturas e o Criador. Paz é a inocência original, onde o homem vive em harmonia consigo mesmo, com Deus, com os outros e com a natureza. Para o cristianismo a paz não é um estado passageiro entre duas guerras.

Mas se todos querem a paz, por que temos guerra? Não nos esqueçamos que toda violência, e estamos envoltos nela, é uma forma de guerra. O novo século que estamos vivendo deveria ser mais pacífico que o século passado, pois com a globalização, a guerra seria um suicídio, dado a eficiência das armas. Porém, os motivos para a guerra não faltam. Estamos sempre em guerra.

De onde nos pode vir a paz? Esta é a pergunta que todos se fazem. Jesus certa vez chorou sobre Jerusalém e disse:  “Se reconhecesses aquele que pode te conduzir à paz. Mas agora está oculto a teus olhos!”(Lc 19,42). É Jesus que pode nos conduzir à paz. Ele é a nossa paz, como escreve o apóstolo Paulo aos Efésios (2,14). Porém  muitos ainda não o vêem, não ouvem sua voz.

A liturgia da Igreja Católica celebra junto com o dia da paz universal, Maria Mãe de Deus. Comtemplamos a figura desta mulher que tem nos braços o menino que nos traz a paz. Somos agradecidos a ela porque aceitou de Deus a missão de dar a luz a este filho. Agradecemos porque acolheu a vida, embora o nascimento de Jesus foi envolto em dificuldades para Maria e José. E concluímos que a paz somente pode brotar do amor. Um amor que exige de nós a renúncia ao egoísmo.

A mensagem central de Jesus é o Reino de Deus, Deus sendo Pai de todos e todos vivendo como irmãos: fraternidade universal! Viver no amor é uma decisão pessoal e um compromisso que cada um deve assumir. A pessoa que decidiu fazer de sua vida um ato de amor, não busca primariamente o prazer ou o aplauso. Seu desejo básico é se tornar um ser humano que ama e, portanto, um ser humano realizado, potencializado para transmitir a paz.

Que a paz esteja conosco neste ano que se inicia e que nós saibamos ser construtores de paz!

terça-feira, 18 de dezembro de 2012

Natal no Ano da Fé

 
Mensagem de Natal e Ano Novo da Presidêncida do Regional Sul 1
 
A Presidência da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) - Regional Sul 1 (São Paulo) felicita a todos por meio de uma mensagem, divulgada nesta segunda-feira (17). Na mensagem, eles expressam a alegria de poder celebrar o Natal no Ano da Fé.

 
NATAL NO ANO DA FÉ
 
O Natal celebra um grande Mistério da nossa fé:
O Filho de Deus se fez homem
para que nós tivéssemos em comunhão com Deus!
            
Nesta “maravilhosa troca de dons entre o céu e a terra”,
Deus nada perde, mas o homem tem tudo a ganhar!
 
A vinda de Deus ao nosso encontro é o motivo da nossa fé 
e do compromisso alegre com o anúncio da Boa Nova!

Feliz e Santo Natal do Senhor!
Feliz e abençoado Ano Novo!

Cardeal Dom Odilo P. Scherer
Arcebispo de São Paulo
Presidente do Regional Sul 1 da CNBB

Dom Moacir Silva
Bispo de São José dos Campos
Vice-Presidente

Dom Tarcísio Scaramussa
Bispo Auxiliar de São Paulo
Secretário geral

segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

Pascom define atividades para 2013


Já estão definidas as datas das atividades da Pastoral da Comunicação para o próximo ano

Na última reunião da Pastoral da Comunicação do Regional Sul 1 da CNBB, de 2012, realizada, nesta quinta-feira (13), em São Paulo, os agentes definiram as datas para o próximo ano. De acordo com o calendário, o 19º Encontro Regional de Comunicação deverá acontecer no dia 22, 23 e 24 de novembro, em local ainda a ser definido.

Entre as atividades, estão as reuniões que vão acontecer em São Paulo nosdias 25 de fevereiro, 29 de abril, 29 de agosto, 7 de outubro, 4 de novembro e 12 de dezembro.

Segundo a coordenadora da Pascom, irmã Maria Celeste Ghislandi, está confirmada para o dia 20 de junho, uma formação para a coordenação e representantes das sub-regiões, com o tema “Espiritualidade do comunicador”. A finalidade é proporcionar uma formação de espiritualidade, promovendo a comunhão entre a equipe, que durante o ano, se encontra apenas para reuniões de trabalho.

Ainda segundo a coordenadora, os agentes foram informados sobre algumas datas de âmbito nacional como o Encontro de Assessoria de Imprensa da CNBB, marcado para março em Brasília (DF); 47º Dia Mundial das Comunicações Sociais que será celebrado nas paróquias e dioceses no dia 12 de maio, no Domingo da Ascensão do Senhor; Encontro Nacional dos Bispos Referenciais e coordenadores da Pascom dos Regionais, de 23 a 25 de agosto em Brasília (DF), e o 8º Mutirão Brasileiro de Comunicação, de 27 de outubro a 1º de novembro em Natal (RN).

Na ocasião também os agentes avaliaram o 18º Encontro Regional de Comunicação, realizado em novembro, na Arquidiocese de São Paulo, bem como as ações da Pascom, em 2012. De acordo com as avaliações respondidas pelos participantes, o encontro atingiu seu objetivo de proporcionar conteúdo de qualidade para quem está iniciando e para a reciclagem dos que estão há mais tempo atuando nesta pastoral.

A reunião foi aberta pelo Bispo Referencial Dom José Moreira de Melo, contou com a presença da coordenadora irmã Maria Celeste Ghislandi e dos Representantes das sub-regiões. As atividades e informações sobre a Pascom podem ser acompanhadas na rede social: facebook.com/PascomSul1

sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

Papa Bento XVI divulga mensagem pelo Dia Mundial da Paz

Celebrado no dia 1º de janeiro, o Dia Mundial da Paz é uma data que foi criada para que todas as pessoas, cristãs e não cristãs, se unissem em prol da paz no planeta. Há 45 anos, o papa Paulo VI, divulgou uma mensagem, em 8 de dezembro, para que a data fosse celebrada sempre no primeiro dia do ano civil (1º de janeiro), a partir do ano de 1968.
Seguindo a tradição, a mensagem do sumo pontífice, para o Dia Mundial da Paz 2013, foi apresentada em coletiva de imprensa, hoje, 14 de dezembro, na Sala de Imprensa do Vaticano.

Leia a mensagem:

Dia Mundial da Paz
1º de janeiro de 2013

Bem-aventurados os obreiros da paz

1. Cada ano novo traz consigo a expectativa de um mundo melhor. Nesta perspectiva, peço a Deus, Pai da humanidade, que nos conceda a concórdia e a paz a fim de que possam tornar-se realidade, para todos, as aspirações duma vida feliz e próspera.

À distância de 50 anos do início do Concílio Vaticano II, que permitiu dar mais força à missão da Igreja no mundo, anima constatar como os cristãos, Povo de Deus em comunhão com Ele e caminhando entre os homens, se comprometem na história compartilhando alegrias e esperanças, tristezas e angústias, anunciando a salvação de Cristo e promovendo a paz para todos.

Na realidade o nosso tempo, caracterizado pela globalização, com seus aspectos positivos e negativos, e também por sangrentos conflitos ainda em curso e por ameaças de guerra, requer um renovado e concorde empenho na busca do bem comum, do desenvolvimento de todo o homem e do homem todo.

Causam apreensão os focos de tensão e conflito causados por crescentes desigualdades entre ricos e pobres, pelo predomínio duma mentalidade egoísta e individualista que se exprime inclusivamente por um capitalismo financeiro desregrado. Além de variadas formas de terrorismo e criminalidade internacional, põem em perigo a paz aqueles fundamentalismos e fanatismos que distorcem a verdadeira natureza da religião, chamada a favorecer a comunhão e a reconciliação entre os homens.

E no entanto as inúmeras obras de paz, de que é rico o mundo, testemunham a vocação natural da humanidade à paz. Em cada pessoa, o desejo de paz é uma aspiração essencial e coincide, de certo modo, com o anelo por uma vida humana plena, feliz e bem sucedida. Por outras palavras, o desejo de paz corresponde a um princípio moral fundamental, ou seja, ao dever-direito de um desenvolvimento integral, social, comunitário, e isto faz parte dos desígnios que Deus tem para o homem. Na verdade, o homem é feito para a paz, que é dom de Deus.

Tudo isso me sugeriu buscar inspiração, para esta Mensagem, às palavras de Jesus Cristo: «Bem--aventurados os obreiros da paz, porque serão chamados filhos de Deus» (Mt 5, 9).

A bem-aventurança evangélica

2. As bem-aventuranças proclamadas por Jesus (cf. Mt 5, 3-12; Lc 6, 20-23) são promessas. Com efeito, na tradição bíblica, a bem-aventurança é um género literário que traz sempre consigo uma boa nova, ou seja um evangelho, que culmina numa promessa. Assim, as bem-aventuranças não são meras recomendações morais, cuja observância prevê no tempo devido – um tempo localizado geralmente na outra vida – uma recompensa, ou seja, uma situação de felicidade futura; mas consistem sobretudo no cumprimento duma promessa feita a quantos se deixam guiar pelas exigências da verdade, da justiça e do amor. Frequentemente, aos olhos do mundo, aqueles que confiam em Deus e nas suas promessas aparecem como ingénuos ou fora da realidade; ao passo que Jesus lhes declara que já nesta vida – e não só na outra – se darão conta de serem filhos de Deus e que, desde o início e para sempre, Deus está totalmente solidário com eles. Compreenderão que não se encontram sozinhos, porque Deus está do lado daqueles que se comprometem com a verdade, a justiça e o amor. Jesus, revelação do amor do Pai, não hesita em oferecer-Se a Si mesmo em sacrifício. Quando se acolhe Jesus Cristo, Homem-Deus, vive-se a jubilosa experiência de um dom imenso: a participação na própria vida de Deus, isto é, a vida da graça, penhor duma vida plenamente feliz. De modo particular, Jesus Cristo dá-nos a paz verdadeira, que nasce do encontro confiante do homem com Deus.

A bem-aventurança de Jesus diz que a paz é, simultaneamente, dom messiânico e obra humana. Na verdade, a paz pressupõe um humanismo aberto à transcendência; é fruto do dom recíproco, de um mútuo enriquecimento, graças ao dom que provém de Deus e nos permite viver com os outros e para os outros. A ética da paz é uma ética de comunhão e partilha. Por isso, é indispensável que as várias culturas de hoje superem antropologias e éticas fundadas sobre motivos teorico-práticos meramente subjectivistas e pragmáticos, em virtude dos quais as relações da convivência se inspiram em critérios de poder ou de lucro, os meios tornam-se fins, e vice-versa, a cultura e a educação concentram-se apenas nos instrumentos, na técnica e na eficiência. Condição preliminar para a paz é o desmantelamento da ditadura do relativismo e da apologia duma moral totalmente autónoma, que impede o reconhecimento de quão imprescindível seja a lei moral natural inscrita por Deus na consciência de cada homem. A paz é construção em termos racionais e morais da convivência, fundando-a sobre um alicerce cuja medida não é criada pelo homem, mas por Deus. Como lembra o Salmo 29, « o Senhor dá força ao seu povo; o Senhor abençoará o seu povo com a paz » (v. 11).

A paz: dom de Deus e obra do homem

3. A paz envolve o ser humano na sua integridade e supõe o empenhamento da pessoa inteira: é paz com Deus, vivendo conforme à sua vontade; é paz interior consigo mesmo, e paz exterior com o próximo e com toda a criação. Como escreveu o Beato João XXIII na Encíclica Pacem in terris – cujo cinquentenário terá lugar dentro de poucos meses –, a paz implica principalmente a construção duma convivência humana baseada na verdade, na liberdade, no amor e na justiça.A negação daquilo que constitui a verdadeira natureza do ser humano, nas suas dimensões essenciais, na sua capacidade intrínseca de conhecer a verdade e o bem e, em última análise, o próprio Deus, põe em perigo a construção da paz. Sem a verdade sobre o homem, inscrita pelo Criador no seu coração, a liberdade e o amor depreciam-se, a justiça perde a base para o seu exercício.

Para nos tornarmos autênticos obreiros da paz, são fundamentais a atenção à dimensão transcendente e o diálogo constante com Deus, Pai misericordioso, pelo qual se implora a redenção que nos foi conquistada pelo seu Filho Unigénito. Assim o homem pode vencer aquele germe de obscurecimento e negação da paz que é o pecado em todas as suas formas: egoísmo e violência, avidez e desejo de poder e domínio, intolerância, ódio e estruturas injustas.

A realização da paz depende sobretudo do reconhecimento de que somos, em Deus, uma única família humana. Esta, como ensina a Encíclica Pacem in terris, está estruturada mediante relações interpessoais e instituições sustentadas e animadas por um «nós» comunitário, que implica uma ordem moral, interna e externa, na qual se reconheçam sinceramente, com verdade e justiça, os próprios direitos e os próprios deveres para com os demais. A paz é uma ordem de tal modo vivificada e integrada pelo amor, que se sentem como próprias as necessidades e exigências alheias, que se fazem os outros comparticipantes dos próprios bens e que se estende sempre mais no mundo a comunhão dos valores espirituais. É uma ordem realizada na liberdade, isto é, segundo o modo que corresponde à dignidade de pessoas que, por sua própria natureza racional, assumem a responsabilidade do próprio agir.

A paz não é um sonho, nem uma utopia; a paz é possível. Os nossos olhos devem ver em profundidade, sob a superfície das aparências e dos fenómenos, para vislumbrar uma realidade positiva que existe nos corações, pois cada homem é criado à imagem de Deus e chamado a crescer contribuindo para a edificação dum mundo novo. Na realidade, através da encarnação do Filho e da redenção por Ele operada, o próprio Deus entrou na história e fez surgir uma nova criação e uma nova aliança entre Deus e o homem (cf. Jr 31, 31-34), oferecendo-nos a possibilidade de ter « um coração novo e um espírito novo » (cf. Ez 36, 26).

Por isso mesmo, a Igreja está convencida de que urge um novo anúncio de Jesus Cristo, primeiro e principal factor do desenvolvimento integral dos povos e também da paz. Na realidade, Jesus é a nossa paz, a nossa justiça, a nossa reconciliação (cf. Ef 2, 14; 2 Cor 5, 18). O obreiro da paz, segundo a bem--aventurança de Jesus, é aquele que procura o bem do outro, o bem pleno da alma e do corpo, no tempo presente e na eternidade.

A partir deste ensinamento, pode-se deduzir que cada pessoa e cada comunidade – religiosa, civil, educativa e cultural – é chamada a trabalhar pela paz. Esta consiste, principalmente, na realização do bem comum das várias sociedades, primárias e intermédias, nacionais, internacionais e a mundial. Por isso mesmo, pode-se supor que os caminhos para a implementação do bem comum sejam também os caminhos que temos de seguir para se obter a paz.

Obreiros da paz são aqueles que amam,defendem e promovem a vida na sua integridade

4. Caminho para a consecução do bem comum e da paz é, antes de mais nada, o respeito pela vida humana, considerada na multiplicidade dos seus aspectos, a começar da concepção, passando pelo seu desenvolvimento até ao fim natural. Assim, os verdadeiros obreiros da paz são aqueles que amam, defendem e promovem a vida humana em todas as suas dimensões: pessoal, comunitária e transcendente. A vida em plenitude é o ápice da paz. Quem deseja a paz não pode tolerar atentados e crimes contra a vida.

Aqueles que não apreciam suficientemente o valor da vida humana, chegando a defender, por exemplo, a liberalização do aborto, talvez não se dêem conta de que assim estão a propor a prossecução duma paz ilusória. A fuga das responsabilidades, que deprecia a pessoa humana, e mais ainda o assassinato de um ser humano indefeso e inocente nunca poderão gerar felicidade nem a paz. Na verdade, como se pode pensar em realizar a paz, o desenvolvimento integral dos povos ou a própria salvaguarda do ambiente, sem estar tutelado o direito à vida dos mais frágeis, a começar pelos nascituros? Qualquer lesão à vida, de modo especial na sua origem, provoca inevitavelmente danos irreparáveis ao desenvolvimento, à paz, ao ambiente. Tão pouco é justo codificar ardilosamente falsos direitos ou opções que, baseados numa visão redutiva e relativista do ser humano e com o hábil recurso a expressões ambíguas tendentes a favorecer um suposto direito ao aborto e à eutanásia, ameaçam o direito fundamental à vida.

Também a estrutura natural do matrimónio, como união entre um homem e uma mulher, deve ser reconhecida e promovida contra as tentativas de a tornar, juridicamente, equivalente a formas radicalmente diversas de união que, na realidade, a prejudicam e contribuem para a sua desestabilização, obscurecendo o seu carácter peculiar e a sua insubstituível função social.

Estes princípios não são verdades de fé, nem uma mera derivação do direito à liberdade religiosa; mas estão inscritos na própria natureza humana – sendo reconhecíveis pela razão – e consequentemente comuns a toda a humanidade. Por conseguinte, a acção da Igreja para os promover não tem carácter confessional, mas dirige-se a todas as pessoas, independentemente da sua filiação religiosa. Tal acção é ainda mais necessária quando estes princípios são negados ou mal entendidos, porque isso constitui uma ofensa contra a verdade da pessoa humana, uma ferida grave infligida à justiça e à paz.

Por isso, uma importante colaboração para a paz é dada também pelos ordenamentos jurídicos e a administração da justiça quando reconhecem o direito ao uso do princípio da objecção de consciência face a leis e medidas governamentais que atentem contra a dignidade humana, como o aborto e a eutanásia.

Entre os direitos humanos basilares mesmo para a vida pacífica dos povos, conta-se o direito dos indivíduos e comunidades à liberdade religiosa. Neste momento histórico, torna-se cada vez mais importante que este direito seja promovido não só negativamente, como liberdade de – por exemplo, de obrigações e coacções quanto à liberdade de escolher a própria religião –, mas também positivamente, nas suas várias articulações, como liberdade para: por exemplo, para testemunhar a própria religião, anunciar e comunicar a sua doutrina; para realizar actividades educativas, de beneficência e de assistência que permitem aplicar os preceitos religiosos; para existir e actuar como organismos sociais, estruturados de acordo com os princípios doutrinais e as finalidades institucionais que lhe são próprias. Infelizmente vão-se multiplicando, mesmo em países de antiga tradição cristã, os episódios de intolerância religiosa, especialmente contra o cristianismo e aqueles que se limitam a usar os sinais identificadores da própria religião.

O obreiro da paz deve ter presente também que as ideologias do liberalismo radical e da tecnocracia insinuam, numa percentagem cada vez maior da opinião pública, a convicção de que o crescimento económico se deve conseguir mesmo à custa da erosão da função social do Estado e das redes de solidariedade da sociedade civil, bem como dos direitos e deveres sociais. Ora, há que considerar que estes direitos e deveres são fundamentais para a plena realização de outros, a começar pelos direitos civis e políticos.

E, entre os direitos e deveres sociais actualmente mais ameaçados, conta-se o direito ao trabalho. Isto é devido ao facto, que se verifica cada vez mais, de o trabalho e o justo reconhecimento do estatuto jurídico dos trabalhadores não serem adequadamente valorizados, porque o crescimento económico dependeria sobretudo da liberdade total dos mercados. Assim o trabalho é considerado uma variável dependente dos mecanismos económicos e financeiros. A propósito disto, volto a afirmar que não só a dignidade do homem mas também razões económicas, sociais e políticas exigem que se continue « a perseguir como prioritário o objectivo do acesso ao trabalho para todos, ou da sua manutenção ».4 Para se realizar este ambicioso objectivo, é condição preliminar uma renovada apreciação do trabalho, fundada em princípios éticos e valores espirituais, que revigore a sua concepção como bem fundamental para a pessoa, a família, a sociedade. A um tal bem corresponde um dever e um direito, que exigem novas e ousadas políticas de trabalho para todos.

Construir o bem da paz através de um novo modelo de desenvolvimento e de economia

5. De vários lados se reconhece que, hoje, é necessário um novo modelo de desenvolvimento e também uma nova visão da economia. Quer um desenvolvimento integral, solidário e sustentável, quer o bem comum exigem uma justa escala de bens-valores, que é possível estruturar tendo Deus como referência suprema. Não basta ter à nossa disposição muitos meios e muitas oportunidades de escolha, mesmo apreciáveis; é que tanto os inúmeros bens em função do desenvolvimento como as oportunidades de escolha devem ser empregues de acordo com a perspectiva duma vida boa, duma conduta recta, que reconheça o primado da dimensão espiritual e o apelo à realização do bem comum. Caso contrário, perdem a sua justa valência, acabando por erguer novos ídolos.

Para sair da crise financeira e económica actual, que provoca um aumento das desigualdades, são necessárias pessoas, grupos, instituições que promovam a vida, favorecendo a criatividade humana para fazer da própria crise uma ocasião de discernimento e de um novo modelo económico. O modelo que prevaleceu nas últimas décadas apostava na busca da maximização do lucro e do consumo, numa óptica individualista e egoísta que pretendia avaliar as pessoas apenas pela sua capacidade de dar resposta às exigências da competitividade. Olhando de outra perspectiva, porém, o sucesso verdadeiro e duradouro pode ser obtido com a dádiva de si mesmo, dos seus dotes intelectuais, da própria capacidade de iniciativa, já que o desenvolvimento económico suportável, isto é, autenticamente humano tem necessidade do princípio da gratuidade como expressão de fraternidade e da lógica do dom. Concretamente na actividade económica, o obreiro da paz aparece como aquele que cria relações de lealdade e reciprocidade com os colaboradores e os colegas, com os clientes e os usuários. Ele exerce a actividade económica para o bem comum, vive o seu compromisso como algo que ultrapassa o interesse próprio, beneficiando as gerações presentes e futuras. Deste modo sente-se a trabalhar não só para si mesmo, mas também para dar aos outros um futuro e um trabalho dignos.

No âmbito econômico, são necessárias – especialmente por parte dos Estados – políticas de desenvolvimento industrial e agrícola que tenham a peito o progresso social e a universalização de um Estado de direito e democrático. Fundamental e imprescindível é também a estruturação ética dos mercados monetário, financeiro e comercial; devem ser estabilizados e melhor coordenados e controlados, de modo que não causem dano aos mais pobres. A solicitude dos diversos obreiros da paz deve ainda concentrar-se – com mais determinação do que tem sido feito até agora – na consideração da crise alimentar, muito mais grave do que a financeira. O tema da segurança das provisões alimentares voltou a ser central na agenda política internacional, por causa de crises relacionadas, para além do mais, com as bruscas oscilações do preço das matérias--primas agrícolas, com comportamentos irresponsáveis por parte de certos agentes económicos e com um controle insuficiente por parte dos Governos e da comunidade internacional. Para enfrentar semelhante crise, os obreiros da paz são chamados a trabalhar juntos em espírito de solidariedade, desde o nível local até ao internacional, com o objectivo de colocar os agricultores, especialmente nas pequenas realidades rurais, em condições de poderem realizar a sua actividade de modo digno e sustentável dos pontos de vista social, ambiental e económico.

Educação para uma cultura da paz:o papel da família e das instituições

6. Desejo veementemente reafirmar que os diversos obreiros da paz são chamados a cultivar a paixão pelo bem comum da família e pela justiça social, bem como o empenho por uma válida educação social.

Ninguém pode ignorar ou subestimar o papel decisivo da família, célula básica da sociedade, dos pontos de vista demográfico, ético, pedagógico, económico e político. Ela possui uma vocação natural para promover a vida: acompanha as pessoas no seu crescimento e estimula-as a enriquecerem-se entre si através do cuidado recíproco. De modo especial, a família cristã guarda em si o primordial projecto da educação das pessoas segundo a medida do amor divino. A família é um dos sujeitos sociais indispensáveis para a realização duma cultura da paz. É preciso tutelar o direito dos pais e o seu papel primário na educação dos filhos, nomeadamente nos âmbitos moral e religioso. Na família, nascem e crescem os obreiros da paz, os futuros promotores duma cultura da vida e do amor.

Nesta tarefa imensa de educar para a paz, estão envolvidas de modo particular as comunidades dos crentes. A Igreja toma parte nesta grande responsabilidade através da nova evangelização, que tem como pontos de apoio a conversão à verdade e ao amor de Cristo e, consequentemente, o renascimento espiritual e moral das pessoas e das sociedades. O encontro com Jesus Cristo plasma os obreiros da paz, comprometendo-os na comunhão e na superação da injustiça.

Uma missão especial em prol da paz é desempenhada pelas instituições culturais, escolásticas e universitárias. Delas se requer uma notável contribuição não só para a formação de novas gerações de líderes, mas também para a renovação das instituições públicas, nacionais e internacionais. Podem também contribuir para uma reflexão científica que radique as actividades económicas e financeiras numa sólida base antropológica e ética. O mundo actual, particularmente o mundo da política, necessita do apoio dum novo pensamento, duma nova síntese cultural, para superar tecnicismos e harmonizar as várias tendências políticas em ordem ao bem comum. Este, visto como conjunto de relações interpessoais e instituições positivas ao serviço do crescimento integral dos indivíduos e dos grupos, está na base de toda a verdadeira educação para a paz.

Uma pedagogia do obreiro da paz

7. Concluindo, há necessidade de propor e promover uma pedagogia da paz. Esta requer uma vida interior rica, referências morais claras e válidas, atitudes e estilos de vida adequados. Com efeito, as obras de paz concorrem para realizar o bem comum e criam o interesse pela paz, educando para ela. Pensamentos, palavras e gestos de paz criam uma mentalidade e uma cultura da paz, uma atmosfera de respeito, honestidade e cordialidade. Por isso, é necessário ensinar os homens a amarem-se e educarem-se para a paz, a viverem mais de benevolência que de mera tolerância. Incentivo fundamental será « dizer não à vingança, reconhecer os próprios erros, aceitar as desculpas sem as buscar e, finalmente, perdoar »,7 de modo que os erros e as ofensas possam ser verdadeiramente reconhecidos a fim de caminhar juntos para a reconciliação. Isto requer a difusão duma pedagogia do perdão. Na realidade, o mal vence-se com o bem, e a justiça deve ser procurada imitando a Deus Pai que ama todos os seus filhos (cf. Mt 5, 21-48). É um trabalho lento, porque supõe uma evolução espiritual, uma educação para os valores mais altos, uma visão nova da história humana. É preciso renunciar à paz falsa, que prometem os ídolos deste mundo, e aos perigos que a acompanham; refiro-me à paz que torna as consciências cada vez mais insensíveis, que leva a fechar-se em si mesmo, a uma existência atrofiada vivida na indiferença. Ao contrário, a pedagogia da paz implica serviço, compaixão, solidariedade, coragem e perseverança.

Jesus encarna o conjunto destas atitudes na sua vida até ao dom total de Si mesmo, até «perder a vida» (cf. Mt 10, 39; Lc 17, 33; Jo 12, 25). E promete aos seus discípulos que chegarão, mais cedo ou mais tarde, a fazer a descoberta extraordinária de que falamos no início: no mundo, está presente Deus, o Deus de Jesus Cristo, plenamente solidário com os homens. Neste contexto, apraz-me lembrar a oração com que se pede a Deus para fazer de nós instrumentos da sua paz, a fim de levar o seu amor onde há ódio, o seu perdão onde há ofensa, a verdadeira fé onde há dúvida. Por nossa vez pedimos a Deus, juntamente com o Beato João XXIII, que ilumine os responsáveis dos povos para que, junto com a solicitude pelo justo bem-estar dos próprios concidadãos, garantam e defendam o dom precioso da paz; inflame a vontade de todos para superarem as barreiras que dividem, reforçarem os vínculos da caridade mútua, compreenderem os outros e perdoarem aos que lhes tiverem feito injúrias, de tal modo que, em virtude da sua acção, todos os povos da terra se tornem irmãos e floresça neles e reine para sempre a tão suspirada paz.

Com esta invocação, faço votos de que todos possam ser autênticos obreiros e construtores da paz, para que a cidade do homem cresça em concórdia fraterna, na prosperidade e na paz.

Vaticano, 8 de Dezembro de 2012.

*Tradução Canção Nova.

quarta-feira, 12 de dezembro de 2012

Dom Vilson recebe equipe da Catequese junto à pessoa com deficiência

Dom Vilson e a equipe da Catequese junto
à pessoa com deficiência
No dia 1 de dezembro, o presidente da Comissão para animação Bíblico-catequética do Regional Sul 1 da CNBB, Dom Vilson Dias de Oliveira, DC, recebeu na residência episcopal em Limeira (SP), a equipe executiva da Catequese junto à pessoa com deficiência.

Estavam presentes: Pe. Décio José Walker, Assessor da Comissão de Animação Bíblico-Catequética da CNBB, os representantes da Sub-Região de Campinas: membros da Pastoral dos Surdos da diocese de Limeira; os representantes da Sub-Região RPI: Vanilda; os representantes da Sub-Região SPI: Margarete, Maria Aguilar, Solange, Mario; os representantes da Sub-Região SPII: Sonia, Paulo, Ir. Daiane, Cícera; os representantes da Pastoral da Pessoa com deficiência da Arquidiocese de São Paulo: Valter e Neuza; os representantes do Movimento Fé e Luz: Walter e Marcia.

Na ocasião o bispo apresentou o texto a Juventude e Iniciação à Fé, destacando a “A perspectiva cristã de nossa catequese mistagógica tem muito a oferecer quando nos remete a fonte de nossa fé: a experiência a partir da fé no Ressuscitado. Essa experiência catecumenal que abre a todos a oportunidade de refletir os fundamentos de sua fé a partir da própria experiência e participação nos mistérios sacramentais em comunidade, gera a possibilidade de engajamento mais profundo de nossos jovens e adolescentes na Igreja. Estimulá-los a uma vivência mística e operante da fé, é aguçar neles a curiosidade na busca do entendimento do mistério pela prática do seguimento do evangelho, ao trabalhar neles o desenvolvimento de suas potencialidades, desde a mais tenra idade, encorajando-os ao descobrimento de dons e carismas em nossos núcleos catequéticos”.

O padre Décio também apresentou os projetos da catequese neste próximo período de 4 anos, e para catequese junto à pessoa com deficiência, a preparação de um subsídio inspirado no V Seminário Nacional da Catequese junto à pessoa com deficiência para o próximo ano; e foi sugerida uma proposta que no ano de 2014 seja realizado o Seminário de Iniciação de Cristã junto com a Catequese junto à pessoa com deficiência.

Na reunião, o Sr. Valter e Neuza apresentaram a trajetória da Pastoral da Pessoa com Deficiência da Arquidiocese de São Paulo, o grupo que se formou para trabalhar no tema da Campanha da Fraternidade 2006, e continuou fazendo Fóruns após a Campanha da Fraternidade de 2006, e que faz 2 que foi constituída como Pastoral da Pessoa com Deficiência e procuram desenvolver um trabalho de evangelizando e a união junto com os catequistas é um meio de aprender e também ensinar dinâmicas que faça fomentar o trabalho catequético no Regional Sul 1, apresentaram também os textos Construindo a Teologia da Inclusão de Valter Ceccheti, e o texto Catequese Inclusiva do Pe. Antônio Marcos Depizzoli e o Projeto Igreja Acessível, que procura sensibilizar e envolver a comunidade para a inclusão das pessoas com deficiência na vida eclesial.

Colaboração, Cícera Thadeu dos Santos da Diocese de Mogi das Cruzes

 

domingo, 9 de dezembro de 2012

Universidades católicas

A recente nomeação da Reitora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) causou diversas reações na comunidade acadêmica da Universidade: estranheza, contrariedade e aprovação. Aparentemente, o motivo foi a escolha, pelo Grão Chanceler da Universidade, não do primeiro nome da lista tríplice que lhe foi apresentada, mas do terceiro. Reações até certo ponto compreensíveis.

Talvez algumas reações decorreram da interpretação equivocada do processo de escolha do Reitor e Vice Reitor da PUC-SP. Conforme o Estatuto da PUC-SP, compete ao Conselho Superior da Universidade (CONSUN) “organizar, através de consulta direta à comunidade, por meio de processo eletivo, a lista tríplice de nomes de professores para escolha e nomeação do Reitor e respectivo Vice Reitor, nos termos deste Estatuto, encaminhando-a ao Grão Chanceler” (Art 21/XXII).

E prevê ainda o mesmo Estatuto que ao Grão Chanceler compete ”escolher e nomear o Reitor e o Vice Reitor dentre os professores de uma lista tríplice organizada e encaminhada pelo CONSUN” (Art. 43/II). Portanto, não se trata de escolha direta do Reitor e do Vice pela comunidade universitária; se assim fosse, não haveria sentido na apresentação de uma lista tríplice pelo CONSUN, e estaria prevista a eleição direta, pura e simples, do Reitor e do Vice pela comunidade universitária. Mas não é isso o que consta no Estatuto.

É verdade que a escolha do Reitor recaiu, tradicionalmente, sobre o nome mais votado, pelas razões que a Autoridade competente julgou convincentes; eu mesmo, na escolha precedente, procedi assim. Mas se, desta vez, seguiu outra ordem, é porque esta possibilidade sempre esteve implicada na própria apresentação da lista tríplice pelo CONSUN ao Grão Chanceler.

Toda essa questão leva a refletir algo mais sobre as Universidades Católicas, que estão ligadas à Igreja e são regidas, quanto à sua natureza e missão, pela Constituição Apostólica Ex Corde Ecclesiae (“Do Coração da Igreja”, 1991), do papa João Paulo II. Elas têm sua origem “do coração da Igreja” e expressam, da maneira que lhes é própria, a missão da  Igreja na busca e explicitação do verdadeiro saber (“sapientia”) e do bem da humanidade. No que se refere ao ordenamento acadêmico, elas seguem a legislação civil do país onde se encontram; mas quanto à sua identidade, orientação e objetivos específicos, elas estão sujeitas às normas da Igreja.

Uma universidade católica, como qualquer outra, é uma comunidade de estudiosos, dos vários campos do saber humano; também ela se dedica à pesquisa, ao ensino e às várias formas de serviço à sociedade, compatíveis com sua identidade e missão. Enquanto “católica” e, em nosso caso, também “pontifícia”, ela está ligada à Igreja, segue suas diretrizes e deve realizar suas atividades de maneira coerente com os ideais, princípios e comportamentos católicos; nem se poderia esperar que fosse diversamente, ou até o contrário disso.

No entanto, não equivale isso a dizer que todos os que frequentam a universidade católica devam ser confessionalmente católicos; a própria PUC-SP acolhe muitos estudantes que não professam a fé católica e são todos bem vindos; a liberdade de consciência é plenamente respeitada e o credo católico não é imposto a ninguém. Mas é certo que a própria universidade tem a missão de apresentar e honrar a sua identidade diante de todos os que a frequentam e integram a comunidade acadêmica.

A liberdade de pensamento, ensino e manifestação das ideias, consagrada pelas Constituições dos países democráticos, assegura esse direito às instituições confessionais e não confessionais. Regimes totalitários, geralmente, são intolerantes em relação a universidades “confessionais”, ou que não se alinhem plenamente ao pensamento único e oficial, impedindo até mesmo a sua existência e livre atuação.

Poderia parecer que as universidades católicas e outras, de tipo confessional, existem apenas para a vantagem das próprias Instituições que as mantêm, mas isso é outro equívoco. Elas são, antes de mais nada, instituições de educação, ensino, formação de pessoas e de fomento da cultura dos povos, à luz de suas próprias percepções e interpretações da realidade. E não deve ser visto como um dano para a sociedade que haja instituições com diversos tipos de diretrizes na educação e na formação dos cidadãos. O conjunto da cultura e do convívio social fica enriquecido com uma sadia pluralidade educacional. Contrariamente, se tudo tendesse ao pensamento oficial e único, haveria o risco de uma cultura monótona e com horizontes sempre mais estreitos. Isso não representaria um benefício para a convivência plural e democrática.

A universidade católica tem uma contribuição específica a dar para a formação cultural; e essa contribuição decorre da visão cristã sobre o homem e o mundo, que tem desdobramentos, entre outras coisas, na filosofia em geral, na antropologia, na ética, educação, na psicologia, na economia, na política e também na técnica. Esses princípios cristãos oferecem uma forma própria de interpretação sobre o homem, a sociedade, as relações sociais e a história; e também, sobre a natureza e a interação do homem com o ambiente da vida.

Mais uma vez, entendo que a universidade católica não tem a finalidade de impor as expressões próprias de uma “cultura cristã” às pessoas e ao convívio social, mas de as oferecer como contribuição, que procede da sua própria autoconsciência, para o enriquecimento da cultura e da vida social. A universidade católica é, por excelência, um espaço de diálogo cultural, onde ela tem muito a oferecer, ex corde Ecclesiae, a partir do âmago de sua identidade, da sua mensagem e da experiência secular da Igreja.

Publicado em O ESTADO DE SÃO PAULO, ed. de 08.12.2012
Card. Odilo P. Scherer
Arcebispo de São Paulo

Identidade e pluralismo: a missão da PUC

A Pontifícia Universidade de São Paulo (PUC-SP) esteve em evidência na imprensa nos últimos dias, em função da recente nomeação da professora Anna Maria Marques Cintra como Reitora da instituição; quero, pois, esclarecer o papel e a preocupação da Igreja Católica, presente na gestão de uma universidade.
Antes, porém, reitero que a nomeação está de acordo com a norma da Universidade. Escolhi a Reitora entre os candidatos da lista tríplice organizada e encaminhada a mim pelo Conselho Superior da Universidade (CONSUN), como estabelece o estatuto da PUC-SP.

Há quem considere que a PUC-SP cumpriria melhor o seu papel sendo uma universidade laica, desvinculada da Igreja. Isso, porém, não seria coerente com a natureza de nossa universidade católica que, além de tudo, também é “pontifícia”.

Não cabem equívocos, nesse sentido, e não dissimulo meu empenho para evidenciar e fortalecer na PUC-SP a sua identidade católica. Assim fazendo, não busco simplesmente que ela esteja alinhada com os valores cristãos, mas que dê sua contribuição específica, como instituição católica, à sociedade paulista e brasileira.

Uma universidade católica não existe apenas para defender a Igreja. O seu fim primário é o serviço à verdade e ao bem do homem. E para nós, católicos, esse afã não coloca em risco a nossa fé: na visão cristã, é plenamente harmônica a relação entre fé e razão. “Religião do Logos, o Cristianismo não relega a fé para o âmbito do irracional – afirma Bento XVI –, mas atribui a origem e o sentido da realidade à única Razão criadora”.

A unidade entre fé e razão é um elemento essencial do pensamento cristão, que não está fechado em si mesmo. A fé, ao contrário de ser limite, é luz, que amplia a visão e as perspectivas para uma análise serena e positiva dos acontecimentos sociais e para uma compreensão mais profunda do mundo e do fenômeno humano.

Para um pesquisador cristão, a coerência com a sua fé não o faz sobrepor ao seu trabalho critérios alheios à ciência; sua própria fé leva-o ao amor à verdade e ao respeito pela dignidade da pessoa humana. Num contexto relativista, como o atual, uma universidade católica contribui para mostrar que há valores inegociáveis, como a busca da verdade, o valor da vida humana em todas as suas etapas e a dignidade da mulher.

A Universidade Católica, diz ainda o Papa, está chamada “a não limitar a aprendizagem à funcionalidade de um êxito econômico, mas a ampliar a sua ação em vista de projetos em que o dom da inteligência investiga e desenvolve as dádivas do mundo criado, superando uma visão apenas produtivista e utilitarista da existência”.

Essa especial missão não a faz ser superior às outras universidades, mas deve levá-la a uma atitude de serviço, de diálogo e de abertura às outras instituições educativas, num autêntico espírito universitário.
Reconheço que, no meio acadêmico contemporâneo, a maneira cristã de ver o mundo e o ser humano não é compartilhada por todos. No entanto, isso não desqualifica a sua contribuição para a pluralidade da cultura; antes, explicita ainda mais a sua relevância para a construção de uma sociedade aberta, na qual possa haver um confronto entre dados de fato e valores. Karl Popper observa que uma sociedade aberta necessita de valores, que ela própria não está em condições de produzir para si mas, muitas vezes, vai buscar no cristianismo.

Por isso, mesmo, num mundo que parece esquecer-se de Deus, uma universidade católica tem uma importante função social, também como contribuição para o pluralismo e a liberdade de pensamento. E isso não parece irrelevante para o convívio democrático!


Cardeal Odilo Pedro Scherer
Arcebispo de São Paulo

SP 05.12.2012

quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

Dom Tarcísio é nomeado vigário geral da Arquidiocese




O cardeal dom Odilo Pedro Scherer, arcebispo metropolitano, nomeou como vigário geral “ad ínterim” para a Arquidiocese de São Paulo dom Tarcísio Scaramussa (foto), bispo auxiliar da arquidiocese e vigário da Região Episcopal Sé.

O bispo assume a partir da publicação do ato de Nomeação. De acordo com o ato de nomeação, dom Tarcísio assume como vigário geral da Arquidiocese sem prejuízo a outras funções que realize, como por exemplo, o fato de ser o bispo referencial do Setor Juventude.

Em entrevista para o site da Arquidiocese, o bispo disse que sente “grande proximidade, apoio e fraternidade da parte de dom Odilo, o que me faz sentir sempre sereno e seguro no serviço à Arquidiocese de São Paulo.

Leia a íntegra da entrevista:

Site da Arquidiocese -  Como o senhor recebe essa nomeação?Dom Tarcísio Scaramussa - Recebo-a como um mandato de serviço, ao qual me disponho a acolher com alegria e dedicação, como uma extensão do trabalho que já realizo juntamente com os outros bispos auxiliares da Arquidiocese e com dom Cláudio Hummes.

Site da Arquidiocese -  Quais as atribuições deste cargo?Dom Tarcísio - O Vigário geral é alguém a quem o bispo diocesano delega poder ordinário para ajudá-lo no governo de toda a diocese. De acordo com o Código de Direito Canônico, "compete ao Vigário geral o poder executivo que, por direito, pertence ao Bispo diocesano, para praticar os atos administrativos, exceto aqueles que o Bispo tenha reservado a si, ou que, pelo direito, requeiram mandado especial do Bispo" (Cân. 479). Dom Odilo nomeou-me interinamente, ou seja, por um período provisório.

Site da Arquidiocese -  Como o senhor vê a confiança da Igreja no senhor?Dom Tarcísio - A Igreja é mediação de Deus, portanto, sinto em cada chamado de serviço que ela faz a vontade de Deus para mim. O Senhor que nos confia uma missão, nos assiste em todos os momentos, também através da própria Igreja. Particularmente, tenho sentido grande proximidade, apoio e fraternidade da parte de dom Odilo, o que me faz sentir sempre sereno e seguro no serviço à Arquidiocese de São Paulo.

Fonte:  Site da Arquidiocese de São Paulo

Creio no Deus que vem

Por Cardeal Odilo Pedro Scherer, Arcebispo de São Paulo e Presidente do Regional Sul 1 da CNBB

Iniciamos a celebração do Advento dentro do Ano da Fé. A qual “Mistério da fé” nos referimos neste tempo litúrgico? Penso que poderíamos resumir os vários aspectos da nossa fé, implicados no Advento, com esta afirmação: “creio no Deus que vem”.

Nosso Deus não é estático, nem imóvel ou fechado em si mesmo. A criação do mundo já revelou que ele “saiu de si mesmo”, expandiu a sua glória e imprimiu sua sabedoria em incontáveis obras, dando-lhes o ser e a dinâmica própria. E veio ao encontro do homem, criatura que ama mais que todas, pois nela imprimiu “sua imagem e semelhança”, dando-se a conhecer a ele, dialogando com o homem e chamando-o a ser seu cooperador e amigo.

O Deus em quem nós cremos, portanto, não é simplesmente abstrato, distante, incognoscível. Ele é, sim, o Deus grande e misterioso, que supera tudo o que possamos pensar e dizer com palavras e conceitos humanos; mas não é inacessível, ausente, desconhecido. É o Deus sábio, providente, atraente e amoroso que, de muitas formas, deu-se a conhecer ao homem.

Cremos no Deus fiel, que promete e cumpre; pode o homem falhar e ser infiel ao seu pacto com Deus; mas Deus fala e cumpre, pois é verdadeiro não só no existir, mas também no agir. Num mundo de aparências e dissimulações, de deslealdades e mentiras, parece até impossível que alguém não seja assim. Mas nosso Deus é veraz e totalmente digno de confiança.

Cremos no Deus que se tornou próximo de nós por meio de Jesus Cristo, Filho de Deus feito homem por meio da Virgem Maria: em Jesus Cristo, cujo nascimento recordaremos novamente no Natal, Deus aproximou-se de maneira inimaginável do homem, assumiu a nossa frágil condição para estar ao nosso lado, falar-nos humanamente, ouvir nossos gemidos, mostrar-nos o caminho do acesso a ele e comunicar sua Santidade à nossa humana e pecadora natureza.

O Natal celebra um Mistério da fé tão grande, que aos homens parece impossível ser verdadeiro; sábios e entendidos ficam confusos e permanecem descrentes; mas os pequenos e humildes se alegram, pois são capazes de compreender que aquilo que não é possível ao homem, a Deus é possível!

Cremos no Deus que virá. Nossa fé nos fala de Deus como aquele que nunca está ausente da vida do homem e do mundo, mas tem seu olhar continuamente voltado para a “obra da sua sabedoria”. Nada mais contrário à nossa fé católica, que imaginar um Deus de braços cruzados, ausente, distraído e desinteressado das coisas que não são Deus. Mesmo deixando a liberdade e a autonomia às coisas criadas, Deus as acompanha com seu olhar providente, continuamente voltado para nós e para tudo o que criou com amor; um olhar amoroso e continuamente criador que, se fosse desviado por um instante, deixaria as coisas caírem novamente no seu nada.

O Advento também nos fala do “Deus que virá”; a seu encontro nós vamos, passo a passo, para estar com ele definitivamente no final de nossa vida. Por isso, a Liturgia do Advento nos chama à vigilância, para não nos distrairmos ao longo da vida, nem perdermos o rumo e a grande meta do caminho, que é o encontro definitivo com Deus e a felicidade sem fim.

Esta vida é, para nós, o tempo de realizarmos o bem e de correspondermos ao amor do Deus que vem, optando livremente por ele; e assim, deixando-nos atrair e envolver por ele, vivendo entre as coisas que passam, busquemos continuamente as que não passam.

Publicado em O SÃO PAULO, ed. de 04.12.2012